quinta-feira, 13 de junho de 2013

Quinta-Feira

O ar entra nos meus pulmões em ispirações automáticas e regulares. A rádio preenche o vazio que as vozes não enchem, uma vez que ninguém fala. Não os censuro. Afinal de contas também  não profiro uma palavra. A estrada é longa e não há vontade para grandes conversas. Somos desconhecidos no nosso pequeno mundo, vivendo nos mesmos sitios, tendo hábitos semelhantes e parecendo-nos todos uns com os outros, somos mais complexos do que aparentamos.
Lá fora a vida parece mais fácil. As ovelhas que se vêm pela janela não precisam de mais do que a erva que comem. Parecem felizes, desconhecendo que na próxima Páscoa, ou quiçá antes disso, irão servir de alimento a alguma família, dessas que também não falam nos autocarros.
Passam-se campos de feno e casas abandonadas. Pergunto-me quem terá vivido ali, no meio daquele campo que está agora coberto de flores. É uma casa modesta, daria para umas quatro ou cinco pessoas, mais se os tempos fossem outros, mas neste momento não vive lá ninguém. Consigo imaginar crianças a brincar ao esconde nas árvores mais ao fundo. Seriam felizes com certeza, afinal de contas são crianças, têm esse direito, tal como as ovelhas que já ficaram para trás há muito.
Um pequeno monitor mostra o trailler de um filme de  comédia. Parece engraçado mas ninguém se ri, provavelmente ninguém olha.
Penso na milha família que ficou em casa. Há quem diga que sou fotocópia da minha mãe. Quem me dera que fosse verdade. A minha mãe é uma lutadora daquelas que certamente não se vêm nos filmes de comédia. A vida tornou-a uma pessoa mais forte mas ultimamente tem-na mandado abaixo. O cansaço é muito e o corpo começa a não aguentar. Cada vez que a vejo sorrir, sorrio também. Faz-me falta. Muita mesmo. E faria falta a todos se esses também a conhecessem tão bem como eu.
O meu pai era capaz de aparecer num filme de comédia. Gosta de fazer os outros rir. Penso que herdei isso dele, embora hoje não esteja muito para aí virada. Os olhos azuis claros, que neste caso não herdei, deixam transparecer tudo o que lhe vai na alma. Alegrias, desilusões, amores e tristezas, tudo se vê naqueles olhos cor de céu. Também me faz falta.
Despedi-me do meu irmão com um beijo na testa, enquanto ele se esforçava para abrir os olhos. Orgulho-me dele todos os dias e desejo-lhe o melhor do mundo. Sei que ele merece.
Lá fora o sol dá cor aos campos de trigo, que crescem depressa e bem. Uma cegonha cuida do filho no ninho que construiu em cima de um poste de electricidade. Vêm-se coisas bonitas quando se presta atenção ou simplesmente quando se olha com olhos de ver. Devia fazer isso mais vezes. Um cartaz publicitário indica que "a sua visão muda o mundo", não podia concordar mais.
Sem me dar conta chegamos à primeira paragem.

Foto Inspiration | via Facebook

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